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Sábado, Maio 17, 2025

Moçambique: Xigubo, Uma Dança Guerreira

África continua a ser um continente desconhecido onde o silêncio esconde segredos ancestrais e os sonhos se tornam em aventuras. É um continente enigmático que convida à imaginação, desafiando a lógica com cada suspiro do vento. Mergulha agora neste universo, onde o passado e o presente se entrelaçam num enigma sem fim e fica a conhecer uma dança guerreira que é o orgulho de Moçambique.

Moçambique: Xigubo, Uma Dança Guerreira


O Xigubo, conhecido como dança típica dos distritos de Matutuíne e Namaacha (província de Maputo) desde o século XVI, era usado como uma demonstração de prontidão para a luta contra a ocupação portuguesa, particularmente no sul do país.

É hoje uma das principais atracções artístico-culturais assumidas um pouco por todo o território nacional, em resultado da sua massificação, através de interacção entre grupos de várias províncias.

Na sua apresentação, os dançarinos de Xigubo dispõem-se numa ou duas filas, vestidos de peles de animais, plumas e penas na cabeça, braçadeiras feitas à linha, chocalhos amarrados nos tornozelos, empunhando um escudo feito também de pele de animais e um bastão. Tudo em forma de representação de um guerreiro.

Antigamente, as peles usadas no fabrico do vestuário dos bailarinos eram apenas da chita, um animal cujas tonalidades se assemelham às do leopardo. Actualmente, são usadas também peles de antílopes, macacos, entre outros animais.

A dança manifesta, através da expressão do corpo dos bailarinos que se esmeram para revelar as suas aptidões físicas, a força guerreira para transmitir mais segurança à assistência. Até porque as vestes de peles são sinal de poder e força.

Reza a história que o Xigubo é praticado no sul da região Austral de África desde a fixação dos Zulu, na África do Sul. A dança expandiu-se para territórios vizinhos, como resultado da expansão deste povo guerreiro para as zonas de outros povos bantu.


Como Chega a Moçambique


Imagem © 2021 Alcides Tamele (20250422) Moçambique Xigubo, Uma Dança Guerreira

Em Moçambique, por exemplo, a história da dança remonta do século XVI, quando moçambicanos de Matutuíne, então Circunscrição de Maputo, começaram a emigrar para a vizinha África do Sul à procura de emprego.

Natural da vila de Bela-Vista, sede do distrito de Matutuíne, Abel Eduardo Machango, nascido a 8 de Julho de 1958, contou que o Xigubo foi trazido para aquela região por mineiros moçambicanos a trabalhar na África do Sul.

“O Xigubo é uma dança guerreira, mas ela foi massificada nas companhias mineiras da África do Sul, durante os intervalos de descanso dos trabalhadores”.

“Os nossos concidadãos trouxeram esta dança para o país, mas com uma cadência diferente da praticada nas minas”.

Conta Machango que revela ainda ser o uso de determinado tipo de pele de animais é demonstração de supremacia em relação aos demais grupos culturais ou de outros bailarinos.

Explica que a designação de Xigubo como dança guerreira não tem relação com a luta de libertação nacional, mas com as guerras de resistência à ocupação e dominação colonial.

Os guerreiros preparavam-se para a luta, por isso, há, durante a dança, movimentos de força, de ataques e de defesa feitos pelos bailarinos, que é uma demonstração de prontidão para a guerra.

A história revela que muitas vezes, no fim de grandes batalhas históricas, o Xigubo era dançado para a preparação dos guerreiros. Mas também para a celebração das suas vitórias, daí a designação de “dança guerreira”.

Em Moçambique, o Xigubo começou a massificar-se a partir do Sul, com os distritos de Matutuíne e Namaacha a se destacarem, particularmente depois da independência nacional. A sua rápida expansão deveu-se também aos festivais culturais.

Apesar de ter adquirido características moçambicanas, o Xigubo tem semelhanças e diferenças nos países onde é praticado.


Semelhanças e Diferenças


Imagem © 2021 Alcides Tamele (20250422) Moçambique Xigubo, Uma Dança Guerreira

Moçambique, África do Sul e Suazilândia são os três países da África Austral onde o Xigubo é dançado, sendo que o aspecto comum é que os dançarinos perfilam em uma ou duas filas viradas para um maestro, com percussionistas atrás ou nas laterais. Há semelhanças na indumentária.

As diferenças notam-se somente na cadência. Os movimentos dos bailarinos, no Xigubo dançado em Moçambique, é executado de forma mais rápida e os seus dançarinos não levantam o pé para além da sua cintura.

Na vizinha África do Sul e na Suazilândia, os bailarinos levantam o pé até à altura da cabeça e batem no chão com muita força e, por vezes, se lançam ao chão, mas sempre com o escudo e o bastão nas mãos.

Nestes dois países, a dança também é praticada por mulheres, nalguns casos em grupos separadas dos homens.


O Mestre Judas Tembe


Imagem © 2021 Alcides Tamele (20250422) Moçambique Xigubo, Uma Dança Guerreira

O Xigubo da Bela-Vista é o grupo cultural que mais se destaca em Matutuíne, quiçá, em toda a região sul do país. Foi criado pelo mestre Judas Mandalaza Tembe, nos anos 1974/75. Ele foi bailarino de renome que viajou pelo mundo para dançar e ensinar.

Judas Mandalaza Tembe nasceu e sempre residiu em Matutuíne, onde viria a perder a vida a 25 de Junho de 2010, quando se celebrava 35 anos da independência nacional. Destacou-se entre os trabalhadores das minas da África do Sul que se juntavam para dançar.

Tembe começou por dançar apenas com a família. Os instrumentistas eram as suas mulheres e tinha como bailarinos os filhos, primos e outros parentes próximos para não ser acusado de promover actos que ferissem a moral.

Mais tarde, Judas Tembe começou a incluir outras pessoas fora da sua família, nomeadamente o mestre Santaca e Nwaxihazi, com quem dançava.

O Xigubo da Bela-Vista sempre se destacou e foi referência nos festivais culturais, dada a sua perfeição, determinação e mestria com que os seus elementos executam esta dança.


Azarias, o Seguidor


Azarias Lázaro Sibia é um jovem de 25 anos de idade, nascido em Matutuíne. Assume-seImagem © 2021 Alcides Tamele (20250422) Moçambique Xigubo, Uma Dança Guerreira como seguidor do mestre Judas Tembe. Começou a dançar o Xigubo em 2002, com apenas dez anos.

Caracteriza o Xigubo como uma dança de entretenimento. Na sua infância via na expressão um “passatempo”, pois as crianças não tinham condições de ter um televisor.

“Preferíamos ver os mais velhos a dançarem para tentarmos ser como eles”.

Explica Azarias, actual maestro do Xigubo da Bela-Vista.

“Conheci o mestre Judas quando eu era criança”.

“Ele dançava com a sua família e os filhos, mas quando estes cresciam abandonavam o grupo e iam para a África do Sul à busca de sobrevivência”, diz o jovem.

Conta que foi a partir dessa altura que o mestre Judas começou a ensinar outras pessoas para preservar a dança.

“Fui um dos beneficiários destes ensinamentos e chegou uma altura em que ele me levava a todas as suas actuações porque tínhamos uma ligação muito forte”.

Devido à proximidade que tinha com o precursor do Xigubo, muita gente no distrito chegou a pensar que Azarias fosse filho do “velho Tembe”, mas não é.

Em 2010, Azarias Lázaro Sibia começou por ser coreógrafo do grupo. Respondia pelos ensaios, organização de equipamentos e outras questões porque um dos filhos do mestre, Jacinto Tembe, foi à cidade de Maputo para concluir o nível pré-universitário.

“Desde então respondo pelo grupo, porque viram a minha entrega ao trabalho (o fundador ainda estava vivo, mas sem forças para dançar)”.

“Ele tem outros filhos mais velhos que voltaram da África do Sul, mas optaram por deixar as coisas como estavam”, afirmou.

Actualmente a trabalhar no Governo Distrital de Matutuíne, Azarias Lázaro Sibia terminou a 12.ª Classe, e explica que durante as actuações se concentra apenas na dança e não nos expectadores, com vista a evitar erros na coreografia.


Centros Comunitários


Para Preservar a Dança

Informações do Instituto de Investigação Artístico Cultural (ARPAC) indicam que o Xigubo em Moçambique teve a sua origem no distrito de Matutuíne. Ela expandiu-se para outras regiões como resultado de intercâmbios culturais, da mesma maneira que em Matutuíne já se dança Makwayela e Xingomana, expressões originárias de outros pontos do país.

Para a preservação do Xigubo, as autoridades do distrito incentivam os grupos culturais a integrarem bailarinos mais jovens para garantir a passagem de testemunho e, por via disso, se perpetuar a dança.

“O ideal seria criarmos um centro comunitário de desenvolvimento cultural, que pode abarcar outras expressões culturais, incluindo a pesquisa histórica”.

“Infelizmente, ainda não conseguimos recursos para implementar esta iniciativa”, lamenta Abel Eduardo.

Machango


A única forma que se usa para preservar a dança é juntar grupos culturais que a praticam para ensaios colectivos e a organização de festivais de canto e dança no distrito, onde os praticantes trocam ideias e partilham experiências sobre a matéria.

Em Matutuíne, por exemplo, estão registados 18 grupos que praticam o Xigubo. Mas apenas 13 é que dançam com regularidade, apresentando-se em festivais.


Já tinhas ouvido falar ou já conhecias o Xigubo? Queremos saber a tua opinião, não hesites em comentar e se gostaste do artigo partilha e dá um “like/gosto”.

 

Imagem: © 2021 Francisco Lopes-Santos
Alcides Tamele

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