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ToggleNturudu, o Carnaval da Guiné-Bissau
Todos os anos ou quase todos, o Carnaval da Guiné-Bissau – Nturudu 1Magdalena Bialoborska, Miguel de Barros. Nturudo: ao encontro do carnaval da Guiné-Bissau. Buala. [Online] 15 de Abril de 2019. [Citação: 06 de Maio de 2025] como se diz em crioulo – combina a alegria com as diversas culturas do pequeno – pela geografia, mas grande pela história – país da África Ocidental.
Nturudu, palavra que designa uma máscara gigante, no sentido de feio ou assustador, uma das grandes atrações das festividades. O Carnaval, como todos sabemos, presente em muitas partes do mundo, manifesta-se de diversas e variadas formas.
Na Guiné-Bissau, tornou-se numa entidade única, própria, que junta pessoas do país inteiro e de vários grupos étnicos e socioculturais, e com muito poucas semelhanças com outros carnavais 2Kowalski, Andrzej. Carnaval na Guiné uma grande “desbunda” multi-étnica. Cenalusofona. [Online] [Citação: 06 de Maio de 2025] .
Foram os espanhóis, portugueses e franceses que levaram o Carnaval da Europa durante os processos de conquista e colonização e essas festividades foram bem aceites no que viria a tornar-se a América Latina e as Caraíbas.
Em África, não foi o caso e o continente ofereceu mais resistência. A Guiné-Bissau é a «excepção» e seguramente os sociólogos e antropólogos terão uma ou várias explicações em relação a isso.
Se até à Independência o Carnaval era europeizado, tornou-se depois da Independência, num palco de manifestações culturais locais, embora tenha mantido o grande desfile principal na avenida central de Bissau 3Raimanova, Dasa. Carnaval de Bissau: Celebração da cultura guineense. [Online] 19 de Fevereiro de 2020. [Citação: 06 de Maio de 2025] – realizado pela primeira vez em 1979, ao qual assisti – e inúmeros pequenos desfiles paralelos que representam a cultura e tradições de muitas etnias guineenses.
Se em geral o Carnaval são três dias, na Guiné-Bissau, sobretudo em Bissau, pode-se prolongar por mais tempo 4Kalmasoul. Carnaval 2019. Kalmasoul. [Online] 2019. [Citação: 06 de Maio de 2025] . Depois dos desfiles de máscaras, as ruas de Bissau continuam repletas de música e barracas com gastronomia tradicional. A festa só acaba semanas depois.
E se é verdade que não é só em Bissau que se faz a festa – existem desfiles em outras cidades e regiões – é nas ruas da capital, inundadas por milhares de pessoas, que a diversidade cultural deste “pequeno país gigantesco”, com 23 etnias e 9 idiomas, se concentra.
Em meados de Fevereiro, uma enorme e inebriante manifestação de alegria popular assume matizes de identidade social e artística ímpares.
Em Bissau, as máscaras gigantes e assustadoras, feitas de lama, forradas com mais de cinco camadas de pasta de papel dos sacos de cimento e farinha e água fervida em fogareiros de carvão e pintadas com cores garridas, representam os símbolos e rituais das mais de vinte etnias do país.
O saber fazer destas máscaras – um dos símbolos das tradições urbanas do país – é passado de geração em geração e as crianças iniciam-se e aprendem a técnica depois de ver os mais velhos fazê-las.
As máscaras produzidas para o Carnaval da Guiné-Bissau são consideradas uma das mais originais dos diversos carnavais africanos e são utilizadas, independente de estilo, com o propósito de passar uma mensagem.
Um certo reconhecimento dessa realidade, foi traduzida – embora tenha passada despercebida – na exposição fotográfica de grandes dimensões intitulada: “O Nturudu – Um Carnaval Sem Máscara”.
Da autoria de Arlindo Camacho, integra 18 retractos, cada um com cerca de 4 metros de altura, financiado pelo Camões, I.P., com o apoio da Secretaria de Estado da Cultura da República da Guiné-Bissau, com base no registo fotográfico do Carnaval de 2020 e patente na emblemática fábrica de óleo de amendoim, no Ilhéu do Rei, em Bissau 5Instituto Camões. Guiné-Bissau: Inauguração da Exposição “Nturudu – Um Carnaval Sem Máscara”. Instituto Camões. [Online] 31 de Dezembro de 2020. [Citação: 06 de Maio de 2025] .
Para desfilar no cortejo de Bissau onde participam os bairros, cada grupo concorre com uma rainha, danças e tem de ter pelo menos cem pessoas e trinta máscaras de grande porte – com cerca de dois quilos e mais de um metro. Para cada ano é escolhido um tema que serve como ponto de partida para a criatividade carnavalesca.
Em Bissau há também espaço para o “carnaval infantil” que é o desfile das crianças de diferentes jardins e escolas infantis do país que apresentam e desfilam com danças tradicionais e recitação de poesias e a invocação do que significa ser criança na Guiné-Bissau.
Ao longo dos anos a temática levantou importantes questões sociais e culturais, conduzindo a uma reflexão durante os preparativos, sobre as questões ligadas com o tema, tais como a valorização da diversidade cultural e a reconciliação entre os povos, a liberdade e a saúde.
As máscaras ganham vida durante o Nturudu (Entrudo), através de trajes, danças, cancões e coreografias únicas, que fazem do Carnaval guineense uma das manifestações populares mais simbólicas de todos os carnavais africanos.
Para alem das máscaras podem-se observar no desfile vários costumes e evocações de rituais ancestrais, que simbolizam, entre outros, adoração aos deuses; aos que partiram, embora sempre presentes, ao Iran (espírito supremo), cerimónias de iniciação, de casamento, de funerais (toka tchuru), da época das colheitas.
O Carnaval é também uma festa gastronómica com as barracas a venderem comidas típicas do país como: Caldo de Mancara, Caldo de Chabeu, Cuscuz de milho, Cafriela, Peixe seco, Sigá, Canjas de Caquere e muita bebida.
Os diferentes grupos escolhem as músicas e as alegorias, no entanto as máscaras, os trajes dos elencos dos grupos e os pequenos carros alegórico devem estar em conformidade com o lema do Carnaval, que serve também de critério de avaliação. Os júris do concurso de Carnaval levam em conta originalidade, inovação, criatividade, expressividade e identidade.
Antes, durante e depois do Carnaval a cidade de Bissau acolhe grandes manifestações populares e artísticas e a sua dinâmica muda completamente, com a chegada de novas pessoas das diferentes regiões do país e emigrantes, vem-se muitas saias bijagós e jovens raparigas com o corpo untado com óleo de palma para participarem nas competições.
Como todos os carnavais, o de Bissau, também proporciona momentos em que se esquecem os problemas, as diferenças, as regras sociais vigentes tornam-se mais ligeiras e cria-se um espaço critico da sociedade, da política e do governo.
Para alguns sociólogos e antropólogos, o Carnaval também é visto como tendo uma função dentro do projecto nacional, e serve para apoiar a construção da identidade nacional. Nesse sentido, dizem eles, é usado como um dos instrumentos para construir a identidade nacional, como um espaço de união das diversas culturas e etnias que compõe o mosaico social do país.
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Bibliografia:
- Magdalena Bialoborska, Miguel de Barros. Nturudo: ao encontro do carnaval da Guiné-Bissau. Buala. [Online] 15 de Abril de 2019. [Citação: 06 de Maio de 2025]
- Kowalski, Andrzej. Carnaval na Guiné uma grande “desbunda” multi-étnica. Cenalusofona. [Online] [Citação: 06 de Maio de 2025]
- Raimanova, Dasa. Carnaval de Bissau: Celebração da cultura guineense. [Online] 19 de Fevereiro de 2020. [Citação: 06 de Maio de 2025]
- Kalmasoul. Carnaval 2019. Kalmasoul. [Online] 2019. [Citação: 06 de Maio de 2025]
- Instituto Camões. Guiné-Bissau: Inauguração da Exposição “Nturudu – Um Carnaval Sem Máscara”. Instituto Camões. [Online] 31 de Dezembro de 2020. [Citação: 06 de Maio de 2025]
Imagem: © 2021 Francisco Lopes-Santos