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Quinta-feira, Março 20, 2025

Mali Segue a AES e Abandona a Francofonia

O Mali cortou laços históricos e abandonou a Francofonia. Segue assim os passos do Níger e do Burkina Fasso que também já abandonaram a organização. As respectivas Juntas Militares, acusaram a OIF de servir os interesses neocoloniais franceses.

Mali Segue a AES e Abandona a Francofonia


O Mali formalizou a saída da Organização Internacional da Francofonia (OIF) nesta terça-feira, 18 de Março de 2025. A decisão segue o Níger e o Burkina Fasso que anunciaram a retirada na segunda-feira. As juntas militares dos três países acusam a OIF de interferência nos assuntos internos. Esta medida reforça a Aliança dos Estados do Sahel (AES) e aprofunda a parceria com a Rússia.

A ruptura do Mali com a Francofonia surge após anos de tensões com a França, a antiga potência colonial. Em 2020, um golpe militar depôs o presidente Ibrahim Boubacar Keïta, levando à suspensão do país pela OIF.

A organização exigiu a libertação do líder e a transição para um governo civil, mas a junta comandada pelo coronel Assimi Goïta recusou, classificando as exigências como ingerência externa. Desde então, o Mali afastou-se gradualmente das instituições ligadas a Paris.

O Níger e O Burkina Fasso seguiram o mesmo caminho após os golpes de 2022 e 2023, respectivamente. Ambos criticaram a OIF por “parcialidade pró França” e cortaram laços diplomáticos e militares com o país europeu. A criação da AES em 2023 consolidou a cooperação entre os três regimes que deram prioridade às parcerias com a Rússia e a Turquia.

A saída colectiva marca um revés histórico para a influência francesa no Sahel. A OIF, fundada em 1970, enfrenta agora a maior crise desde a sua criação. A organização perde três membros estratégicos num contexto de expansão da presença russa na região.

Os analistas políticos apontam para que a medida reflecte a rejeição de estruturas percebidas como heranças coloniais. O futuro da Francofonia em África depende da capacidade de se reinventar perante as novas dinâmicas geopolíticas.


Ruptura Histórica no Sahel


A decisão do Mali encerra um ciclo de confrontos com a OIF, iniciado após o golpe de 2020. A organização condenou a tomada do poder pelos militares e exigiu a restauração da ordem constitucional. Em resposta, Bamako expulsou as tropas francesas em 2022 e adoptou o russo como língua de trabalho em sectores estratégicos. A medida simbolizou a procura por autonomia face a Paris.

O Níger replicou o modelo após derrubar Mohamed Bazoum em Julho de 2023. A OIF exigiu a libertação do presidente que se encontrava detido no palácio presidencial com a esposa. As autoridades nigerinas suspenderam a cooperação com a organização, acusando-a de servir interesses estrangeiros. Em Outubro, o país substituiu nomes franceses de ruas e monumentos na capital, Niamey.

O Burkina Fasso juntou-se à ruptura sem um anúncio formal, consolidando a frente comum na AES. Os três países abandonaram a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) em Janeiro de 2024, alegando submissão da entidade à França.

A AES dá prioridade a acordos militares com a Rússia, incluindo o recrutamento de efectivos do Grupo Wagner. A mudança vem redefinir o equilíbrio de poder numa região marcada por instabilidade e insurgências.

A Aliança dos Estados do Sahel surge como alternativa às instituições ocidentais. As parcerias com a Turquia incluem investimentos em infraestruturas e energia, enquanto a Rússia fornece armamento e treino. A estratégia visa reduzir as dependências históricas e fortalecer a soberania nacional. Para as juntas, a saída da Francofonia é um passo simbólico na descolonização política e cultural.

A Falência da OIF


A França, a principal financiadora da OIF, enfrenta agora o declínio da sua influência no Sahel. Desde 2022, já perdeu bases militares no Mali, Níger e Burkina Fasso, substituídas por forças russas. A diplomacia parisiense critica a “propaganda anti França” das juntas, mas falhou em conter a aproximação à Rússia.

Desta forma, o vácuo deixado por Paris é preenchido por potências dispostas a ignorar as questões internas dos países que apoiam.

A OIF mantém 91 membros, mas a credibilidade como entidade neutra está em xeque. Os críticos acusam a organização de perpetuar laços coloniais através da língua francesa e a adesão de novos países, como a Guiné-Conacri, também sob regime militar, pode enfrentar resistência. O desafio agora é adaptar-se a um mundo multipolar, onde a francofonia não é sinónimo de alinhamento político.


Impacto Geopolítico


A saída colectiva do Mali, Níger e Burkina Fasso reconfigura o tabuleiro geopolítico africano. A Rússia emerge como principal beneficiária, consolidando parcerias militares e económicas na região. O Grupo Wagner, presente nos três países, garante acesso a recursos naturais como o urânio e o ouro e a Turquia amplia a sua influência através de investimentos em infraestruturas e acordos de defesa.

A França enfrenta o maior revés na sua política africana em décadas. A retirada das tropas e o fim da cooperação militar minam a capacidade de Paris de combater o terrorismo no Sahel. A estratégia de vincular ajuda económica a reformas democráticas falhou, alimentando o ressentimento contra a antiga metrópole e os analistas, alertam para o risco de radicalização em países vizinhos.

A CEDEAO, outrora influente, vê a sua autoridade desafiada pela AES. A aliança saheliana critica a submissão da organização regional a interesses franceses e a saída dos três países enfraquece a capacidade da CEDEAO de mediar crises e impor sanções. Esta divisão vem ameaçar a estabilidade da África Ocidental, já de si afectada por golpes e conflitos étnicos.

A OIF, por sua vez, enfrenta dilemas existenciais. A promoção da língua francesa esbarra na associação com políticas neocoloniais. Países como o Chade e a Guiné-Conacri podem seguir o exemplo da AES, aprofundando a crise da organização. A falta de flexibilidade para dialogar com os regimes militares acelera o declínio da francofonia como poder de influência na região.

O Futuro


O futuro do francês no Sahel permanece incerto. Embora a língua mantenha o estatuto de oficial nos três países, os governos promovem os idiomas locais e o russo em instituições públicas. As escolas e os meios de comunicação começam a adoptar currículos multilíngues, reduzindo a hegemonia cultural francesa. A medida visa fortalecer as identidades nacionais, mas enfrenta desafios logísticos e financeiros.

A comunidade internacional divide-se perante a ascensão da AES. Enquanto a União Europeia condena a aproximação à Rússia, à China e aos Emirados Árabes Unidos que ampliam os seus investimentos.

A Turquia, por seu lado, posiciona-se como mediadora, oferecendo apoio sem exigências democráticas. O pragmatismo económico sobrepõe-se a preocupações com direitos humanos, aprofundando a complexidade da situação.


Conclusão


O Mali, O Níger e o Burkina Fasso consolidam a ruptura com a Francofonia como uma afirmação de soberania. A medida reflecte a rejeição de estruturas associadas ao colonialismo e a procura por novos aliados estratégicos. A AES emerge como actor relevante, desafiando a ordem regional estabelecida.

A OIF perde três membros num momento crítico da sua história, pelo que a organização precisa de repensar a sua missão para evitar mais deserções. O futuro da francofonia em África depende da sua capacidade de se distanciar de interesses franceses e abraçar a diversidade política do continente.

 


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Imagem: © 2025 Francisco Lopes-Santos
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