Índice
ToggleLula Propõe Nova Ordem Financeira Climática
Luiz Inácio Lula da Silva, o Presidente do Brasil, desafiou abertamente a arquitectura financeira mundial durante a 10.ª reunião do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) que teve início esta quinta-feira. Na sua intervenção, denunciou a hipocrisia dos países desenvolvidos perante a crise climática e defendeu o modelo dos BRICS como uma via para a emancipação do Sul Global.
Nas salas do centro de convenções, foi traçado um diagnóstico implacável: o sistema financeiro internacional continua a estrangular os países mais vulneráveis. Lula da Silva apontou os 900 mil milhões de dólares de dívida externa que recaem sobre as nações africanas como uma forma de algemas modernas.
Os juros cobrados excedem frequentemente a capacidade de investimento desses países, impedindo qualquer possibilidade real de desenvolvimento sustentável incapacitando estes países de construírem infra-estruturas básicas como escolas e hospitais, condena sucessivas gerações ao subdesenvolvimento.
Lula traçou um contraste entre as promessas vazias das nações ricas e as acções concretas promovidas pelo banco dos BRICS. Enquanto o Norte Global acumula dívidas climáticas que se recusa a saldar, o NDB financia projectos de energias limpas, muitas vezes em moedas locais — um gesto de ruptura com a hegemonia do dólar.
Mais de 31% dos projectos já dispensam o dólar nos seus contractos, optando por moedas nacionais. Esta autonomia monetária fortalece a soberania económica dos países membros e representa uma alternativa tangível ao modelo condicionado das instituições financeiras tradicionais.
A crise climática, lembrou Lula, exige mecanismos de apoio urgentes e não sistemas lentos, burocratizados e obsoletos. Relembrou ainda a promessa dos 100 mil milhões de dólares anuais assumida em 2009 pelas nações mais ricas — uma promessa sistematicamente incumprida.
“O NDB surge como um instrumento inovador para suprir esta lacuna histórica”.
Afirmou, defendendo a criação de um sistema de financiamento internacional centrado no desenvolvimento humano e não na austeridade.
Falência Ética
Lula da Silva defendeu uma reforma profunda na arquitectura financeira internacional e criticou a lentidão na canalização dos recursos prometidos pelos países ricos para fazer face à crise climática.
Ao lado da presidente do Banco de Desenvolvimento dos BRICS (NDB), Dilma Rousseff, Lula destacou o papel estratégico da instituição criada pelos BRICS e reforçou a necessidade de se criarem novos mecanismos de financiamento sem condicionalidades.
“O nosso banco é mais do que um grande banco para países emergentes”.
“É a prova de que uma arquitectura financeira reformada é viável e que um novo modelo de desenvolvimento mais justo é possível”, afirmou.
Lula saudou o crescimento do NDB desde a sua fundação em 2014, na cimeira dos BRICS realizada em Fortaleza e destacou o interesse manifestado por outros países em aderirem à instituição — o que reforça a credibilidade do banco enquanto alternativa inclusiva e eficaz ao sistema financeiro tradicional.
“O NDB financia projectos alinhados com as prioridades nacionais, sem impor condicionalismos”.
“E mais: 31% desses projectos já são executados em moedas locais, o que reforça a soberania dos países membros”, assinalou.
Desde a sua criação, o banco já aprovou mais de 120 projectos, totalizando cerca de 40 mil milhões de dólares norte-americanos, em áreas como energias limpas, transportes, abastecimento de água e protecção ambiental. No Brasil, mais de 20 projectos foram já contemplados, somando mais de 3,5 mil milhões de dólares.
Lula da Silva, destacou ainda a resposta rápida do NDB às inundações que recentemente assolaram o estado do Rio Grande do Sul, considerando-a um exemplo da agilidade da instituição em momentos de crise. Acrescentou que o banco tem igualmente um papel relevante na transição digital, ao investir em tecnologias nos sectores da saúde, educação, transporte e infra-estruturas.
Mencionou ainda a expectativa de que o NDB venha a financiar um estudo de viabilidade para a instalação de um cabo submarino de dados entre os países dos BRICS, de modo a reforçar a soberania digital dos seus membros.
Solução BRICS
Durante a sua intervenção, Lula da Silva teceu duras críticas ao sistema financeiro mundial, o qual, segundo afirmou, impõe políticas de austeridade aos países pobres, ao mesmo tempo que o mundo continua a gastar biliões em armamento.
Recordou ainda o compromisso assumido pelos países desenvolvidos durante a COP15, em 2009, de mobilizar 100 mil milhões de dólares por ano para apoiar o combate às alterações climáticas — verba que, até hoje, não foi efectivamente disponibilizada.
“O que eram 100 mil milhões por ano, hoje já deveria ser 1,6 biliões”.
“Sem esse financiamento, será impossível cumprir a meta de limitar o aquecimento global a 1,5º C”.
“Até agora, não existe outro planeta habitável. Temos de cuidar deste”.
Lula da Silva criticou também o peso da dívida externa sobre os países africanos e defendeu que instituições como o FMI e o Banco Mundial precisam de ser reformadas, de forma a reflectirem as novas realidades geopolíticas e climáticas do século XXI.
“Não é admissível que o continente africano deva 900 mil milhões de dólares e que o pagamento de juros ultrapasse a sua capacidade de investimento”, lamentou.
Num momento emotivo, o Presidente evocou a situação do Haiti que classificou como “semidestruído”. Revelou ter abordado com o Presidente francês Emmanuel Macron a questão da dívida paga pelo Haiti à França em troca da sua independência.
“O Haiti deveria ser reembolsado em 28 mil milhões de dólares”, afirmou.
Defendeu ainda que o financiamento internacional não deve ser encarado como caridade, mas sim como uma ferramenta legítima de desenvolvimento. Por fim, apelou ao NDB para que assuma um papel de destaque na criação de novas formas de financiamento, sublinhando que a lógica da austeridade só contribui para agravar as desigualdades sociais.
Emergência Africana
Nas florestas do Congo, os guardas-florestais recebem menos de 30 dólares mensais para proteger a segunda maior bacia mundial. Lula da Silva contrastou esse valor com os 10 milhões diários em subsídios a petrolíferas europeias. A matemática da dívida torna-se obscena no Sahel. O Níger gasta 42% do orçamento no serviço da dívida enquanto as secas arrasam as colheitas.
Sempre que se fala em austeridade, o pobre fica mais pobre e o rico fica mais rico”.
“É essa realidade que precisamos de alterar”.
“Como podem adaptar-se ao clima quando os cofres estão vazios?”
A proposta de Lula da Silva é simples: acabar com a austeridade congelando imediatamente os juros para os países com stress hídrico extremo. Em resposta o NDB propõe que até 2026, 50% dos novos financiamentos terão destino africano. A prioridade aos projectos hídricos e energias renováveis.
A intervenção do Presidente brasileiro acontece num momento em que o NDB procura alargar a sua base de membros e consolidar a sua importância no panorama financeiro mundial. A próxima etapa decisiva nas discussões sobre o financiamento climático será a COP30, a ter lugar este ano, em Belém do Pará — evento que Lula classificou como uma oportunidade histórica para o Brasil e para o mundo.
Conclusão
O NBC afirma-se como um contrapeso ético e estratégico na actual arquitectura financeira mundial. A sua expansão no continente africano representa uma oportunidade concreta para libertar economias sufocadas por dívidas históricas, muitas das quais enraizadas em estruturas coloniais ainda activas sob novas formas.
Já chega de declarações de intenção: a urgência climática, o desequilíbrio geopolítico e o peso da dívida impõem decisões corajosas e acções imediatas. Lula da Silva foi categórico: o tempo das desculpas terminou. Os instrumentos de justiça climática existem. Falta apenas a coragem política para romper com a lógica do endividamento perpétuo e do assistencialismo condicionado.
O que pensas destas propostas para o financiamento climático apresentadas por Lula da Silva? Valorizas o nosso jornalismo? Não hesites em comentar. Escreve a tua análise nos comentários e, se gostaste do artigo, partilha-o e dá um “like/gosto”.
Imagem: © 2025 Ricardo Stuckert