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ToggleUNESCO: Moçambique e Guiné-Bissau na Lista
A UNESCO inscreveu este domingo o Parque Nacional de Maputo, em Moçambique, na lista do Património Mundial da Humanidade. O Parque de Maputo está ligado ao parque das Zonas Húmidas iSimangaliso, na África do Sul que já tinha estatuto de património mundial desde 1999.
O parque moçambicano, situado no extremo sul do país, combina áreas marinhas e costeiras e faz parte do hotspot Maputalândia-Pondolândia-Albany. A sua integração na lista, fortalece assim a protecção da biodiversidade local. Também o Arquipélago dos Bijagós, na Guiné-Bissau, foi elevado a Património Mundial Natural, tornando-se no primeiro sítio deste país africano a integrar a lista da UNESCO.
Ao todo, 26 novos locais foram reconhecidos este domingo e incluídos na lista de Património Mundial da UNESCO. 21 de natureza cultural, quatro de âmbito natural e um misto. A decisão foi anunciada esta manhã, em Paris, França, durante a 47.ª reunião do Comité do Património Mundial da Unesco que decorre até dia 16, na sede da organização na capital francesa.
Parque Nacional de Maputo

O Parque Nacional de Maputo é um ecossistema que abrange 1.794 quilómetros quadrados no sul de Moçambique. O comité da UNESCO destacou que o parque inclui ecossistemas terrestres, costeiros e marinhos, abrigando quase 5.000 espécies e complementa os valores de conservação do parque contíguo das Zonas Húmidas de iSimangaliso na África do Sul.
Esta ligação transfronteiriça reforça a protecção da biodiversidade em toda a região de Maputo, criando um corredor ecológico vital. A área apresenta habitats diversos como lagos, lagoas, mangais e recifes de coral, além de longas praias, dunas e zonas húmidas que servem de refúgio para espécies únicas.
Destacam-se as praias de nidificação mais meridionais das tartarugas-de-couro e tartarugas-comuns, e a maior concentração mundial de peixes-rei gigantes. O local funciona ainda como paragem crucial para aves migratórias na rota da África Oriental. Esta conquista coroa um processo de 14 anos, conforme revelou Miguel Gonçalves, administrador do parque:
“É uma emoção muito grande e um orgulho enorme. Foram 14 anos a trabalhar neste processo”.
“Agora temos o dever de proteger este espaço que pertence à humanidade”.
O Parque Nacional de Maputo nasceu em 2021 da fusão entre a Reserva Especial de Maputo e a Reserva Marinha Parcial da Ponta do Ouro, marcando uma transformação radical.
De paisagem devastada pela guerra civil, transformou-se num caso de sucesso de conservação através da parceria com a Peace Parks Foundation que permitiu a reintrodução de 5.388 animais selvagens, incluindo os icónicos elefantes costeiros. Werner Myburgh, CEO da fundação, sublinhou:
“Este mento representa um marco para toda a região, fruto do compromisso inabalável do Governo moçambicano”.
Gustavo Dgedge, Secretário de Estado da Terra e Ambiente, definiu o reconhecimento como um momento histórico que honra décadas de dedicação. O estatuto traz novos desafios, como admitiu Gonçalves:
“Temos planos para gerir o aumento de visitantes, garantindo que a protecção dos habitats permanece prioritária”.
Três estruturas turísticas já recebem visitantes, desde acampamentos rústicos a unidades de luxo, simbolizando o equilíbrio entre conservação e desenvolvimento.
A integração Transfronteiriça
A integração do Parque no Património Mundial sublinha a sua importância como corredor ecológico transfronteiriço com o iSimangaliso e como refúgio de biodiversidade crítica em África. Espécies emblemáticas, como as tartarugas-de-couro e as tartarugas-comuns, utilizam as praias do parque para nidificação — constituindo um dos locais mais ao sul desta prática na região.
Em termos de gestão, tanto Moçambique como a África do Sul partilham responsabilidades através de um comité transfronteiriço. O plano de gestão integrado exige actualizações sobre licenças mineiras, impactos turísticos e conflitos entre humanos e fauna até 2026.
Os Benefícios Locais
Esta designação representa, também, um êxito para as comunidades locais: 20 % das receitas do parque e das receitas turísticas, são revertidas para programas de subsistência sustentável, incluindo agricultura de conservação, pesca sustentável, ecoturismo, aquacultura e reconstrução de mangais.
As estruturas turísticas vão de acampamentos rústicos a opções de luxo, reforçando a economia local. O apoio financeiro inclui fundos como €5,9 M da Blue Action Fund e Green Climate Fund e parcerias da Mozbio para protecção costeira e marinha. Esta mobilização demonstra o compromisso nacional e internacional com a preservação ambiental e o desenvolvimento sustentável.
Arquipélago dos Bijagós

Esta nomeação faz do Arquipélago dos Bijagós, o primeiro sítio da Guiné-Bissau a integrar a lista mundial da UNESCO, após uma nomeação prévia como Reserva da Biosfera obtida em 1996.
A candidatura venceu graças a mais de uma década de trabalho colaborativo. A vitória foi saudada com entusiasmo em Bissau e por toda a diáspora, reflectindo um desígnio nacional de afirmação internacional. E como referiu o Ministro do Ambiente, Viriato Cassamá:
“Um património mundial natural no nosso país é muito importante”.
“De mais a mais, é o primeiro que nós temos ao nível da Guiné-Bissau”.
Localizadas ao largo da costa ocidental da África, as Bijagós abrangem 88 ilhas e ilhéus (sendo cerca de 20 habitados permanentemente), ocupando mais de 10 000 km² de ecossistemas marinhos e costeiros – mangais, sapais, bancos de areia e zonas interditas.
Estas áreas abrigam hipopótamos, manatins africanos, tartarugas-verdes e de couro, além de servirem de abrigo a mais de 870 000 aves migratórias vindas da Europa.
A pequena ilha de Poilão destaca‑se como um dos mais importantes locais de nidificação para as tartarugas‑verdes. Além disso, as Bijagós possuem sítios sagrados, parques naturais — Orango, João Vieira e Poilão — e a área protegida comunitária das ilhas Urok, fundamentais à conservação da biodiversidade e à manutenção dos “saber-fazer” tradicionais das comunidades Bijagó.
O estatuto de Património Mundial Natural traz oportunidades de investimento em projectos de conservação da biodiversidade, capacitação técnica e turismo sustentável. O património cultural e científico dos Bijagós, bem como a sua inclusão em iniciativas como o ProBijagós — financiado pela Cooperação Portuguesa — ganham agora nova visibilidade.
Com esta classificação, a Guiné‑Bissau assume-se como referência na preservação ambiental em África e reforça o fortalecimento da identidade cultural dos povos Bijagó. O reconhecimento internacional coloca o país no mapa da excelência ambiental e abre caminho a futuras parcerias técnicas e financeiras.
A Decisão da UNESCO

Por decisão da UNESCO, este reconhecimento eleva o estatuto de conservação da região, integrando-a numa rede mundial de locais protegidos. Audrey Azoulay, directora‑geral da organização, sublinhou que as Bijagós representam um raro ecossistema costeiro e marinho, onde as comunidades mantêm as suas tradições vivas.
Além deste aval internacional, entidades como o PNUD, a Liga Guineense dos Direitos Humanos, a Universidade de Lisboa e a Embaixada de Portugal felicitaram o país, destacando o pioneirismo dos Bijagós e realçando a importância do protagonismo das comunidades no processo de preservação.
Antes rejeitada em 2012, a candidatura foi revista a partir das recomendações do Comité, resultando num plano de acção que equilibra desenvolvimento económico, ambiente e cultura.
O Ministro do Ambiente, Viriato Cassamá, reconheceu os desafios, como o risco de pressão turística e a fragilidade das infra-estruturas sanitárias, mas prometeu implementar um plano sustentável de gestão para mitigar impactos e garantir a protecção do sítio a longo prazo.
Património da UNESCO nos PALOP
Mbanza Kongo (Angola)

Inscrito em 2017, permanece como um testemunho silencioso do antigo Reino do Kongo. Nas colinas do Zaire, as ruínas do tribunal real e a catedral de Kulumbimbi (1522) falam do primeiro contacto entre a África Central e a Europa. A árvore sagrada Yala Nkuw ainda hoje atrai autoridades tradicionais para cerimónias de justiça, mantendo viva a memória de um reino que resistiu 500 anos.
Cidade Velha (Cabo Verde)

Inscrita em 2009, a Praça do Pelourinho exibe o pilar onde os escravos eram castigados. O Forte Real de São Filipe, erguido contra os ataques dos corsários, vigia a baía onde naus carregadas de gente desenraizada de África iniciavam a travessia atlântica. Nestas ruas nasceu o crioulo cabo-verdiano – a primeira língua mestiça do colonialismo.
Ilha de Moçambique

Inscrita em 1991, conta outra face da história lusófona. A “Cidade de Pedra” com seu labirinto de casas swahili e varandas indo-portuguesas foi entreposto de pérolas e ouro. A fortaleza de São Sebastião, construída com pedras de lastro das naus, resistiu a dois séculos de ataques. Os seus armazéns guardam histórias de monções que traziam tecidos da Índia para trocarem por marfim bantu.
Parque Nacional de Maputo (Moçambique)

Inscrito hoje, é uma extensão transfronteiriça do iSimangaliso, na África do Sul, inscrito em 1999. Inclui ecossistemas terrestres, costeiros e marinhos, e abriga quase 5.000 espécies.O local complementa os valores de conservação do iSimangaliso, aprimorando a proteção da biodiversidade em toda a ecorregião de Maputalândia. Apresenta habitats diversos, incluindo lagos, lagoas, manguezais e recifes de corais.
O parque está localizado no hotspot Maputalândia-Pondolândia-Albany, reflectindo alto endemismo e processos naturais em andamento e destaca a cooperação regional de conservação de longa data.
Arquipélago dos Bijagós – Omatí Minhô

Inscrito hoje, a região inclui uma série contínua de ecossistemas costeiros e marinhos, correspondentes aos ambientes marinhos e intermareais das áreas mais bem preservadas do Arquipélago dos Bijagós, na Guiné-Bissau.O arquipélago é o único arquipélago deltaico activo na costa atlântica africana e um dos poucos no mundo. O local abriga uma rica biodiversidade, incluindo tartarugas-verdes e-de-couro, espécies ameaçadas de extinção, peixes-boi, golfinhos e mais de 870.000 aves limícolas migratórias.
Possui mangais, bancos de lama e zonas intermareais vitais para a vida marinha, além de abrigar espécies vegetais raras, diversas populações de peixes e colónias de aves. A Ilha de Poilão é um local de nidificação de tartarugas de importância mundial.
O Reconhecimento
A UNESCO, ao reconhecer estes sítios como Património da Humanidade, não preserva monumentos congelados. Consagra paisagens vivas onde o passado dialoga com o futuro e onde cada comunidade escreve, dia após dia, um novo capítulo desta herança partilhada.
Estes sítios enfrentam desafios íntimos: em Mbanza Kongo, antenas de telemóveis ameaçam a paisagem espiritual; nos Bijagós, a subida do mar engole cemitérios rituais. Mas a sua força reside justamente na fusão entre património material e imaterial:
“Os bijagós não separam natureza e cultura”.
“O santuário das tartarugas em Poilão é tão sagrado quanto as máscaras de iniciação”.
Explica o antropólogo guineense Sana Na N’Hada.
Conclusão
A elevação do Parque Nacional de Maputo e das Ilhas dos Bijagós a Património Mundial consagra décadas de esforços de conservação em África. Para Moçambique, o reconhecimento valida a transformação de uma área outrora devastada pela guerra num santuário de biodiversidade com 5.000 espécies e corredores ecológicos vitais.
Já para a Guiné-Bissau, as Bijagós representam uma vitória histórica. Após uma tentativa falhada em 2012, o arquipélago com os seus hipopótamos marinhos, 870.000 aves migratórias e sítios sagrados torna-se o primeiro património natural do país. O estatuto reforça a identidade cultural destas comunidades únicas enquanto atrai investimento para turismo sustentável.
Estas conquistas, anunciadas na 47.ª sessão da UNESCO em Paris, confirmam África como guardiã de ecossistemas insubstituíveis. Os desafios – da pressão turística em Maputo às frágeis infra-estruturas nas Bijagós – exigirão uma gestão rigorosa. Mas o caminho está traçado: valorizar o património natural é honrar o passado, proteger o presente e legar futuro.
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Imagem: © 2025 Francisco Lopes-Santos