África: 10 Crises Humanitárias Negligenciadas.
África tem enfrentado uma série de crises humanitárias que, surpreendentemente, têm passado despercebidas à escala global, devido aos interesses mediáticos.
“As necessidades humanitárias globais nunca foram tão grandes quanto em 2023”.
“Isso refletiu-se na cobertura mediática internacional, à medida que os terremotos na Síria e na Turquia, a guerra na Ucrânia e o conflito sem precedentes no Médio Oriente dominaram as notícias”.
“Muitas crises em África, perduram há muito tempo, o que torna desafiador aumentar a consciência dessa situação, quanto a cobertura internacional se foca noutros assuntos”.
Afirmou Andrea Barschdorf-Hager, Directora Executiva da CARE Áustria.
A CARE é uma das principais organizações humanitárias do planeta e lançou um relatório que já vai no seu oitavo ano consecutivo, baseado na análise de notícias em inglês, árabe, francês, alemão e espanhol que revela uma triste realidade.
O relatório, analisa crises esquecidas de uma forma ou de outra que marcam milhões de vidas, desde conflitos a mudanças climáticas. Em 2023, todas as dez crises humanitárias mais subestimadas e menos reportadas ocorreram em África, reforçando a importância de amplificar essas vozes negligenciadas.
Metodologia de Análise
Em colaboração com o serviço de controle e vigilância de media Meltwater, a CARE analisou mais de cinco milhões de artigos online em árabe, inglês, francês, alemão e espanhol, entre Janeiro e Setembro de 2023.
Nessa análise foram identificados os países afetados por conflitos, guerras ou desastres naturais, onde pelo menos um milhão de pessoas foram afectadas. A lista final de 48 países foi classificada com base no número de artigos publicados, destacando-se no relatório as 10 crises mais negligenciadas em todo o mundo que, ironicamente, ou talvez não, ficam todas situadas em África.
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Angola: O Silêncio que Grita
Angola em Números
- 7,3 milhões: Pessoas necessitam de ajuda humanitária.
- 1 milhão: Minas terrestres, ameaçam vidas.
- 000: Pessoas feridas devido às minas terrestres.
Angola, situada no sudoeste africano, encabeça novamente este ano, as crises negligenciadas, com mais de sete milhões de pessoas afetadas por secas, inundações e fome.
Quando se pensa em Angola, a primeira imagem que surge é geralmente a guerra civil que durou décadas, deixando mais de 500.000 mortos. O legado desse conflito persiste, com mais de um milhão de minas terrestres representando uma ameaça constante.
Angola, rica em recursos naturais, enfrenta não apenas a ameaça das minas, mas também de desastres naturais extremos, incluindo inundações e secas prolongadas que afetam gravemente a produção agrícola.
A fome, a insegurança alimentar e a má nutrição persistem, particularmente entre as crianças. Este panorama mostra que Angola enfrenta uma crise humanitária profunda, com 7,8 milhões de pessoas necessitadas de assistência o que exige uma resposta urgente para proteger as populações vulneráveis.
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Zâmbia: Entre a Seca e as Inundações
Os Números da Crise
- 1,35 milhão: Pessoas em situação de insegurança alimentar.
- 60%: Da população vive abaixo da linha da pobreza.
A Zâmbia, frequentemente negligenciada, enfrenta desafios alimentares significativos. A crise climática intensifica padrões climáticos imprevisíveis, contribuindo para inundações seguidas de secas extremas. Esses eventos catastróficos têm implicações sérias na segurança alimentar, com 1,35 milhão de pessoas a enfrentar a insegurança alimentar.
Os preços elevados dos alimentos forçam escolhas difíceis, incluindo o abate de árvores para produzir carvão ou a venda de gado. A necessidade de políticas sólidas de combate às mudanças climáticas e estratégias de desenvolvimento é evidente.
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Burundi: Entre a Fome e a Negligência
Os Números da Crise
- 2,3 milhões: Pessoas sofrendo de insegurança alimentar grave.
- 70.000: Deslocados por desastres naturais.
O Burundi, historicamente marcado por instabilidade política e conflitos étnicos, está entre os países mais densamente povoados do mundo. Desastres naturais, incluindo a elevação do nível do Lago Tanganyika, agravam a situação, levando milhares de pessoas a perderem as suas casas.
A desnutrição e a insegurança alimentar atingem níveis alarmantes. Cerca de 2,3 milhões de pessoas enfrentam insegurança alimentar grave, agravada por altas taxas de inflação, tornando os alimentos básicos inacessíveis, complicam ainda mais a situação das pessoas, enquanto o acesso à educação mostra algum progresso, apesar dos desafios.
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Senegal: As Marés Silenciosas da Fome
Os Números da Crise
- 1,4 milhão: Pessoas enfrentam insegurança alimentar.
- 60%: Aumento da insegurança alimentar em um ano.
O Senegal, atingido pelas crises globais dos alimentos e dos preços, enfrenta um aumento dramático na fome, especialmente durante a estação seca. As mudanças climáticas intensificam os padrões climáticos, prejudicando a agricultura e afetando a disponibilidade de alimentos.
O aumento nos preços dos alimentos, especialmente nos cereais, exige uma resposta urgente. A desigualdade de género agrava a situação, colocando mulheres e raparigas em maior risco durante as crises e os desastres.
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Mauritânia: Os Desafios Multifacetados
Os Números da Crise
- 1,1 milhão: Pessoas dependentes de ajuda humanitária.
- 12,5%: Crianças entre 5 e 14 anos forçadas a trabalhar.
A Mauritânia, uma das nações mais pobres do mundo, situada na borda ocidental do Deserto do Saara, enfrenta uma realidade difícil com condições climáticas secas e inundações intensas. A pobreza persiste, com mais de um milhão de pessoas a necessitarem de ajuda humanitária.
A dependência da agricultura de subsistência torna o país vulnerável a secas, inundações e pragas de gafanhotos, enquanto a instabilidade regional agrava a situação. O casamento infantil é uma preocupação significativa, destacando a necessidade de abordar as questões de género.
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República Centro-Africana: O Ciclo Vicioso
Os Números da Crise
- 6: Nascimentos por mulher em média.
- 55%: Percentagem de crianças que completam o ensino básico.
A República Centro-Africana lida com conflitos armados, deslocamentos em massa e altas taxas de mortalidade infantil há décadas o que resulta em uma crise humanitária persistente. A violência, a insegurança alimentar e as limitações ao acesso à educação afectam gravemente a população, com 3,4 milhões de pessoas a necessitar de assistência em 2023.
A desigualdade de género é proeminente, com altas taxas de violência contra mulheres e raparigas. A limitada participação feminina na educação e na vida económica e uma média de seis nascimentos por mulher, compromete a sua participação na sociedade, destacando a necessidade urgente de mudanças e intervenções.
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Camarões: A Confluência de Crises
Os Números da Crise
- 4,7 milhões: Pessoas necessitam de ajuda humanitária.
- 45%: Aumento previsto nas necessidades de assistência em 2024.
Os Camarões enfrentam simultaneamente crises no Noroeste, no Sul, o conflito na bacia do lago Chade e o dos refugiados da República Centro-Africana. Em 2023, 4,7 milhões de pessoas precisavam de assistência humanitária urgente.
Os conflitos armados e os grupos armados não estatais, desestabilizam o país, forçando milhões a deslocarem-se. A insegurança alimentar atinge 11% da população, com as mudanças climáticas a exacerbar os desastres naturais, afectando a produção agrícola e a segurança alimentar.
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Burkina Fasso: A Crise Mais Grave da História
Os Números da Crise
- 8,8 milhões: Pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza.
- 2 milhões: Deslocados internos desde 2019.
O Burkina Fasso, mergulhado em conflitos armados, golpes militares e deslocamentos em massa, enfrenta uma crise humanitária profunda sem precedentes. Desde 2015, ataques e instabilidade levaram a um aumento significativo de deslocados internos, ultrapassando 2 milhões em Março de 2023.
A fragilidade política e a insegurança alimentar agravam a situação, enquanto os efeitos das mudanças climáticas, incluindo secas e inundações, contribuem para a fome. Mulheres e raparigas, são especialmente afetadas, enfrentando desafios adicionais de acesso à educação e violência de género.
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Uganda: Refugiados e Saúde Materna
Os Números da Crise
- 1,5 milhões: Refugiados acolhidos.
- 284 por 100.000: Taxa de mortalidade materna.
O Uganda, com uma hospitalidade notável que lamentavelmente não se vê no resto do mundo, abriga o maior número de refugiados em África e apesar das suas incríveis riquezas naturais, os esforços para acomodar mais de 1,5 milhão de refugiados, força o país a enfrentar desafios significativos.
O aumento da pressão sobre as comunidades locais devido ao influxo de refugiados, destaca a necessidade de se encontrarem soluções sustentáveis.
O acesso limitado à saúde, agravado pelo clima e pelo crescimento populacional, contribuiu para altas taxas de mortalidade materna exigindo uma abordagem abrangente para superar obstáculos, incluindo a insegurança alimentar, o desemprego e o acesso limitado aos serviços básicos.
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Zimbabwe: Os 4 Cavaleiros do Apocalipse
Os Números da Crise
- 70%: População dependente da agricultura de subsistência.
- Aumento acentuado: Doenças transmitidas pela água.
O Zimbabwe, apesar da sua beleza natural, enfrenta uma combinação de pobreza extrema e crises climáticas, testemunha um aumento significativo de doenças transmitidas pela água e luta contra os rendimentos baixos, a escassez de alimentos e os impactos das mudanças climáticas.
Com mais de 16 milhões de pessoas afetadas pela pobreza extrema, a seca recorrente é uma ameaça constante à segurança alimentar. Surtos de cólera e de tifo devido à má qualidade da água destacam a necessidade crítica de investimentos em mudanças comportamentais e em infraestrutura das águas, e do saneamento básico.
Conclusão
Em um cenário onde muitas crises humanitárias são negligenciadas e as realidades são frequentemente ignoradas, é necessário reforçar a urgência de agir diante destas crises humanitárias.
É imperativo que a comunidade global reconheça essas situações, proporcionando o devido apoio financeiro e recursos para mitigar o sofrimento. A negligência destas crises precisa ser substituída pela compaixão e pela acção coletiva.
O que achas destas crises negligenciadas? Queremos saber a tua opinião, não hesites em comentar e se gostaste do artigo partilha e dá um “like/gosto”.
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Imagem: © Amina Kaikai / CARE International