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ToggleSão Tomé e Príncipe: Reserva Total Da Biosfera
São Tomé e Príncipe entrou para a história ao tornar-se o primeiro Estado Soberano do mundo, a ter todo o seu território, terrestre e marinho, reconhecido como Reserva Mundial da Biosfera. O anúncio feito pela UNESCO no 5.º Congresso Mundial das Reservas da Biosfera, realizado em Hangzhou, China, onde foram também incluídas 26 novas reservas em 21 países.
Até então, apenas a ilha do Príncipe e os ilhéus vizinhos detinham esse estatuto, atribuído em 2012. Com esta decisão, as zonas marinhas, as áreas florestais, as regiões agrícolas, os picos vulcânicos e os ilhéus isolados, passaram a fazer parte de um sistema integrado de protecção e gestão sustentável.
A ilha de São Tomé, com cerca de 859 km² e o Príncipe, com 142 km², estão agora inseridos numa lógica territorial que ultrapassa as fronteiras locais. Cerca de 130 mil habitantes que residem nas áreas abrangidas dependem da agricultura, da pesca e do ecoturismo, actividades que, com este estatuto, ganham nova relevância e exigem práticas conscientes.
Além de São Tomé e Príncipe, também Angola e a Guiné Equatorial passaram a integrar a lista da UNESCO pela primeira vez, num sinal de que os ecossistemas africanos estão a ganhar maior protagonismo nas agendas globais de conservação.
Património e Biodiversidade

A Reserva da Biosfera da ilha do Príncipe, criada a 11 de Julho de 2012, já englobava toda a área terrestre da ilha com uma área de 142 km² e uma população estimada, em 2012, de 8 000 habitantes.
Inclui também os seus ilhéus como Bom Bom, Boné do Jóquei e as Pedras Tinhosas, localizadas a cerca de 20 Km a Sudoeste da ilha do Príncipe. A reserva inclui ainda toda a área marinha e costeira envolvente da Ilha e das Ilhas Tinhosas, totalizando 71.592,5 hectares.
Com uma vegetação densa e clima tropical húmido as temperaturas médias anuais variam entre 21,3 ºC e 29.3 ºC, a ilha é muito acidentada, atingindo 948 metros no Pico do Príncipe, localizado no sul da ilha e que faz parte do Parque Natural Ôbo.
Com 31 milhões de anos, a ilha possui uma densa floresta tropical húmida com uma grande diversidade de espécies vegetais e animais, tanto marinhas como terrestres. Estas espécies têm importância para a conservação da diversidade biológica a um nível global.
Uma das particularidades importantes da Ilha do Príncipe é o convívio equilibrado entre a população da ilha e a sua diversidade ecológica, em alinhamento com os princípios da sustentabilidade. As principais actividades económicas da ilha do Príncipe são a agricultura, a pesca e o turismo.
Esse território caracteriza-se por elevada biodiversidade, ecossistemas marinhos e terrestres ricos, com taxas elevadas de endemismo em plantas vasculares, moluscos, aves, répteis e morcegos. A extensão marinha da reserva abrange recifes de coral, zonas de reprodução de tartarugas marinhas e habitats costeiros sensíveis.
A ilha de São Tomé

Com a extensão da classificação para São Tomé, passaram a estar abrangidas áreas florestais tropicais, planaltos vulcânicos, zonas agrícolas e litoral marinho. A ilha, de origem vulcânica, rodeada pelo Atlântico, apresenta clima equatorial quente e húmido, com rios que nascem na Lagoa Amélia.
Entre os principais ecossistemas encontram-se savanas (525 ha), mangais (230 ha), áreas florestais (19.922 ha) e zonas agrícolas (4.458 ha). A paisagem inclui praias como a das Conchas e a Lagoa Azul, cascatas como a de São Nicolau, o mangal de Malanza e o Parque Natural do Obô.
Os morros vulcânicos, formados por antigas chaminés de lava solidificada, completam o cenário. A flora conta com cerca de 1.200 espécies, das quais 900 autóctones, confirmando elevada taxa de endemismo. O arquipélago é apelidado de “Galápagos de África”, contando em termos faunísticos, com 20 espécies e 8 subespécies endémicas entre as 50 terrestres residentes.
A avifauna é notável, incluindo a narceja-das-florestas, o anjoló e o picanço — todas em risco de extinção — além de várias ameaçadas ou vulneráveis. Nos mamíferos, contam-se duas espécies endémicas, uma subespécie de morcego, um musaranho e o macaco Cercopithecus mona, provavelmente introduzido. Entre os répteis contam-se 21 espécies, sendo 17 endémicas, e oito anfíbios exclusivos.
A biodiversidade estende-se ainda a moluscos, crustáceos, cetáceos e corais. As tartarugas marinhas constituem um dos maiores tesouros da reserva, nidificando nas praias: tartaruga-de-pente, verde, oliva, de couro e cabeçuda. O Ilhéu das Rolas, atravessado pela linha do Equador, é um local essencial para as aves marinhas, tal como os ilhéus de Sete Pedras, Santana e São Miguel.
A classificação garante protecção acrescida a este ecossistema dual, conciliando actividades humanas e conservação. São Tomé revela-se, assim, um dos patrimónios naturais mais valiosos do Golfo da Guiné, com relevância mundial. Paralelamente, preserva uma herança cultural diversa, moldada por influências históricas.
Economia Sustentável

A vida das comunidades locais está profundamente entrelaçada com os recursos naturais. Cerca de 130 mil habitantes vivem nas áreas abrangidas, dependendo da agricultura, pesca artesanal e comércio dos produtos locais como o cacau.
O cacau orgânico são-tomense, de renome internacional, constitui um símbolo de sustentabilidade agrícola com a possibilidade de gerar valor agregado no contexto da biosfera.
O estatuto de reserva traz oportunidades para consolidar práticas agrícolas regenerativas, promover o turismo ecológico de qualidade, melhorar as infra-estruturas sustentáveis e criar emprego nas áreas rurais sem comprometer o ambiente.
Ao mesmo tempo, exige que o governo invista em programas de fortalecimento das comunidades, vigilância ambiental e parcerias institucionais com os privados que garantam recursos financeiros e técnicos.
O Presidente da República de São Tomé e Príncipe, Carlos Vila Nova, manifestou uma profunda emoção e gratidão face ao reconhecimento internacional da UNESCO, afirmando:
“Todos os são-tomenses estão de parabéns. É mais uma prova de que quando queremos podemos fazer”.
O reconhecimento da UNESCO implica ainda a necessidade de se consolidarem políticas de conservação, de reforçar a fiscalização, de se promover a educação ambiental e de garantir que as comunidades locais — historicamente intimamente ligadas à terra e ao mar — assumam maior protagonismo na gestão sustentável dos seus recursos.
O Ministro da Economia e Finanças de São Tomé e Príncipe, Gareth Guadalupe, também se pronunciou acerca da nomeação dizendo:
“Este é um Marco que nos enche de orgulho, mas que acima de tudo, nos convoca a uma maior responsabilidade”.
O governo regional do Príncipe também reafirmou total disponibilidade para fazer a gestão conjunta das áreas e garantir a integração entre Príncipe e São Tomé. Este modelo de integração entre conservação e desenvolvimento representa um desafio, mas também um exemplo para outras nações africanas que procuram conciliar preservação ecológica com progresso humano.
Desafios, Ameaças e Clima

Apesar da conquista, o novo estatuto traz consigo vulnerabilidades e desafios concretos. A subida do nível do mar, a erosão costeira e os fenómenos climáticos extremos representam ameaças reais para ilhas frágeis como São Tomé e Príncipe.
O Presidente de São Tomé e Príncipe, Carlos Vila Nova alertou para o facto de o conjunto do arquipélago ter tido no passado uma dimensão de 1.001 km², mas hoje, estar reduzido a 960 km², pois cerca de 4 % foi “engolido”, devido à subida marítima.
Esse fenómeno obriga a acções urgentes de adaptação climática, reforço de infra-estruturas costeiras, restauração de ecossistemas costeiros e sensibilização comunitária. Sem meios adequados, essas medidas podem permanecer num discurso plano e não se concretizarem.
Além disso, as legislações ambientais devem ser reforçadas, bem como uma fiscalização eficaz aplicada e gestão de conflitos sobre o uso dos solos, entre agricultura, turismo e conservação que devem ser bem geridos. As zonas de uso humano e zona núcleo da reserva, devem claramente delimitar usos permitidos e limites ao impacto.
O modelo de gestão da biosfera exige mecanismos de participação comunitária, transparência e financiamento constante. Sem isso, existe o risco de que a classificação se torne apenas simbólica, sem efeitos práticos na terra. A cooperação internacional também será fundamental para apoiar os projectos de vigilância, pesquisa e fortalecimento institucional.
Reservas da Biosfera da CPLP

A recém-criada Reserva da Biosfera de São Tomé e Príncipe, vem reforçar a presença da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) no mapa mundial da conservação.
A Rede de Reservas da Biosfera da CPLP, estabelecida sob a égide do Programa MaB da UNESCO, constitui hoje um instrumento estratégico de cooperação, partilha de conhecimento e afirmação da lusofonia em torno da sustentabilidade. Ao todo, esta rede integra vinte e quatro reservas reconhecidas pela UNESCO, abrangendo cerca de 211 milhões de hectares e envolvendo mais de 104 milhões de pessoas.
Cada uma destas reservas funciona como laboratório vivo, conciliando a preservação da biodiversidade com o desenvolvimento económico e social das comunidades. No Brasil, foram designadas seis reservas de dimensão continental entre 1991 e 2005, cobrindo quase um quarto do território nacional sendo referências mundiais em termos de conservação.
Em Cabo Verde, a inclusão das ilhas do Fogo e do Maio em 2020 representou um marco para a protecção dos ecossistemas insulares atlânticos. Na Guiné-Bissau, o Arquipélago de Bolama Bijagós, com as suas 88 ilhas e ilhéus, estende-se por mais de um milhão de hectares, sendo reconhecido pela sua riqueza ecológica e cultural.
Em Moçambique, a Reserva da Biosfera das Quirimbas, em Cabo Delgado, integra mangais, recifes de coral e habitats oceânicos que sustentam directamente mais de duzentas mil pessoas.
Estas reservas operam em consonância com os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, abordando questões críticas como a adaptação às alterações climáticas, a gestão costeira e marinha, a vigilancia ambiental e o equilíbrio entre exploração económica e conservação.
A rede enfrenta, contudo, desafios comuns, entre eles a pressão do turismo, a desflorestação e a sobrepesca. Ainda assim, a integração plena de São Tomé e Príncipe reforça a relevância da CPLP como bloco capaz de articular natureza, cultura e desenvolvimento num mesmo horizonte de futuro.
Conclusão
O reconhecimento de São Tomé e Príncipe como o primeiro país do mundo a ter todo o território classificado como Reserva Mundial da Biosfera marca um divisor de águas. Ele traz visibilidade, responsabilidade e uma plataforma para consolidar um modelo de desenvolvimento sustentável baseado na valorização dos recursos naturais.
O presidente Carlos Vila Nova, ao congratular-se com este marco, lembrou que “quando queremos podemos fazer” e convocou todos os são-tomenses a unir mãos na construção de um país mais equilibrado e próspero.
No entanto, para que esse sonho se traduza em realidade, será essencial que o país reforce as suas políticas ambientais, assegure financiamentos eficazes, promova a educação ecológica e envolva genuinamente as comunidades locais, nas decisões que lhes dizem respeito.
São Tomé e Príncipe assume agora uma posição de liderança moral e prática no panorama mundial da conservação. Se conseguir alinhar o estatuto com acções concretas, poderá inspirar outros países insulares ou ecologicamente vulneráveis a seguir um caminho semelhante. É um momento de honra, mas sobretudo de compromisso colectivo com o presente e o futuro da biosfera.
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Imagem: © 2014 Rui Camilo