ONU Apela Ao Fim Da Escalada Militar No Sudão
O Conselho de Segurança da ONU condenou, esta quinta-feira, o ataque dos paramilitares sudaneses das Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla inglesa) em El-Facher, destacando o impacto devastador na população civil e os relatos de atrocidades em grande escala.
Os 15 Estados-membros manifestaram profunda preocupação com a escalada de violência nesta cidade-chave do Darfur, tomada no domingo pelas RSF, e nos seus arredores. O Conselho condenou, em particular, a violência perpetrada pelas RSF contra civis, incluindo execuções sumárias e detenções arbitrárias, e alertou para o risco crescente de atrocidades em grande escala, inclusive com motivações étnicas.
O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, expressou-se “gravemente preocupado com a recente escalada militar” em El-Facher, apelando ao “fim imediato do cerco e das hostilidades”.
As informações sobre violações em massa multiplicam-se desde que as RSF tomaram a cidade no domingo, após 18 meses de cerco, conquistando assim o último grande centro urbano que escapava ao seu controlo na vasta região do Darfur.
De acordo com imagens de satélite analisadas pelo Laboratório de Investigação Humanitária da Universidade de Yale, “os massacres continuam”. O chefe dos paramilitares, Mohamed Daglo, reconheceu na quarta-feira à noite a ocorrência de uma catástrofe na cidade, justificando: “A guerra foi-nos imposta”.
A Organização Mundial da Saúde manifestou-se “consternada com as notícias do trágico assassinato de mais de 460 pacientes e acompanhantes na maternidade saudita de El-Facher“. Segundo a instituição, esta era o único hospital ainda parcialmente operacional na cidade.
Com a tomada de El-Facher às forças armadas sudanesas (SAF, na sigla inglesa), lideradas pelo general Abdel Fattah al-Burhan, as RSF controlam agora toda a região de Darfur, uma vasta área no oeste do Sudão que cobre um terço do país.
As comunicações por satélite continuam interrompidas — excepto para as RSF, que controlam a rede Starlink — e o acesso a El-Facher permanece bloqueado, apesar dos apelos para a abertura de corredores humanitários.
“Mais de dois mil civis foram mortos durante a invasão da milícia em Al-Fashir, que teve como alvo mesquitas e voluntários da Cruz Vermelha”.
Afirmou Mona Nour Al-Daem, responsável pela ajuda humanitária do governo pró-SAF. Em El-Facher, o comité de resistência local que documenta as violações desde o início do conflito, relatou na quarta-feira à noite ter ouvido tiros na zona oeste da cidade, “onde alguns soldados remanescentes lutam com (…) tenacidade”.
Desde a tomada da cidade, mais de 36 mil pessoas fugiram da violência, principalmente para a periferia de El-Facher e para Tawila, cidade localizada 70 quilómetros mais a oeste e que já era a maior zona de acolhimento de refugiados do Sudão, segundo a ONU, com mais de 650 mil deslocados.
O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos alertou para o “risco crescente de atrocidades motivadas por considerações étnicas”, recordando o passado de Darfur, palco de vastos massacres e violações cometidos pelas milícias árabes Janjawid, das quais provêm as RSF, contra as tribos locais Massalit, Four ou Zaghawa, no início dos anos 2000.
Actualmente, as RSF e grupos armados aliados, que instalaram em Darfur uma administração paralela, controlam o oeste do Sudão e certas partes do Sul. As SAF controlam o Norte, o leste e o centro do terceiro maior país de África, devastado por mais de dois anos de guerra civil.
Especialistas temem uma nova divisão do Sudão, após a independência do Sudão do Sul em 2011, ainda que Mohamed Daglo, líder das RSF, tenha afirmado que a tomada completa de Darfur pelas suas forças promoverá a “unidade” do país.
“A libertação de El-Facher é uma oportunidade para a unidade do Sudão e nós dizemos: a unidade do Sudão pela paz ou pela guerra”, declarou Daglo na quarta-feira.
As negociações conduzidas há vários meses pelo grupo conhecido como ‘Quad’ — que reúne os Estados Unidos, o Egipto, os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita — encontram-se num impasse, de acordo com um responsável próximo das negociações, não identificado pela AFP.
As propostas de trégua esbarram, segundo a mesma fonte, “na obstrução contínua” do general Abdel Fattah al-Burhan, líder das SAF, que recusou em Setembro uma proposta que previa tanto o seu afastamento como o das RSF da transição política pós-conflito.
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