Conheces a Festa da Nossa Senhora da Muxima? Não? Então prepara-te para a descobrir.

Enquanto o mundo avança e as tradições se vão diluindo, há celebrações em África que resistem com uma força singular, mantendo viva a fé e a identidade de um povo, mas, da mesma forma, outras novas vão surgindo mostrando que o continente também evolui conseguindo manter a sua ancestralidade.

Hoje, iniciamos uma série de 17 artigos sobre festividades de África, explorando os eventos que dão vida e cor às comunidades do nosso continente. Vamos mergulhar nas histórias e experiências destas celebrações únicas, onde a cultura, a espiritualidade e as tradições resistem ao tempo e ligam gerações.

Em Angola, no coração da vila da Muxima, encontramos uma das mais marcantes manifestações religiosas do continente que reúne milhares de fiéis todos os anos num testemunho de devoção e esperança.

A Festa da Nossa Senhora da Muxima, a maior peregrinação religiosa de Angola e de África, é um símbolo da força espiritual e da união do povo angolano. Entre procissões, cânticos e rezas, esta celebração é um farol de fé e renovação. Aqui, milhares de corações batem em uníssono, guiados pelo espírito da padroeira do país, a Nossa Senhora da Muxima.

Junta-te a nós nesta viagem pela fé, tradição e cultura angolana e descobre por que razão a Muxima é chamada, com tanto carinho, de o “coração de Angola”. Esta celebração vai surpreender-te com a sua autenticidade e inspirar-te com a sua profundidade espiritual.

A Festa da Nossa Senhora da Muxima, realizada anualmente na vila da Muxima, na província de Luanda, é um dos eventos religiosos mais emblemáticos de Angola e um dos maiores símbolos da fé e devoção do seu povo.

Reconhecida como a mais importante peregrinação religiosa do país, Este encontro de fé, reúne milhares de peregrinos de várias regiões do país e do mundo, num testemunho de profunda ligação espiritual e devoção à padroeira de Angola, a Nossa Senhora da Muxima.

Com raízes que remontam ao século XVI, esta festa tornou-se mais do que uma celebração religiosa; é um encontro de oração e adoração, um momento de união, cultura e renovação espiritual, sendo um verdadeiro reflexo da identidade angolana.

Ele reflecte a identidade cultural e a história de Angola, marcando a intersecção entre fé, tradição e comunidade. Ao longo de gerações, a festa tornou-se uma manifestação viva de devoção, simbolizando esperança e unidade em tempos de desafios e celebrações.

A Festa da Nossa Senhora da Muxima carrega um significado profundo que ultrapassa o âmbito religioso. A palavra “Muxima”, significa “coração” em kimbundu e só por si, já revela a essência desta celebração: um acto de entrega e de ligação espiritual com o amor maternal de Maria, a quem os fiéis angolanos recorrem com fé inabalável.

Para muitos, a festa é um momento de renovação espiritual e um refúgio em meio às adversidades da vida. Os testemunhos dos peregrinos reforçam este significado. Um devoto que participou da peregrinação partilhou:

“Venho todos os anos agradecer à Muxima pelas bênçãos na minha vida. Este é o lugar onde me sinto mais próximo de Deus”.

Esta ligação espiritual torna a Muxima um centro de esperança para milhares de pessoas, especialmente para quem procura uma cura física, emocional ou espiritual.

Além disso, a festa é um reflexo da capacidade de resistência do povo angolano. Apesar das dificuldades, milhares de devotos caminham longas distâncias para chegar à vila, carregando consigo promessas, orações e o desejo de reconciliação com Deus. É um momento de fortalecimento da fé e da reafirmação de valores fundamentais como a solidariedade, a gratidão e a humildade.

A história da Nossa Senhora da Muxima, chamada carinhosamente pelo povo de Mamã Muxima, conta episódios marcantes e actos de devoção que atravessaram gerações, tornando-se um dos maiores símbolos de fé e de cultura religiosa em Angola.

Localizada na margem do rio Kwanza, a vila da Muxima fica situada na província do Bengo, a 130 quilómetros de Luanda e a 180 quilómetros da cidade de Caxito, no “coração” da província.

A Igreja dedicada à padroeira é muito mais do que um espaço religioso. Para muitos angolanos, é um lugar sagrado onde se encontram respostas para os seus anseios, curas e milagres, numa ligação íntima entre o povo e a sua “mãe do coração”.

A devoção à Nossa Senhora da Muxima tem origens profundas que remontam ao período colonial. A história começa em 1589, quando missionários portugueses construíram a pequena igreja na margem do rio Kwanza.

Este templo foi inicialmente concebido como um ponto de apoio espiritual para os colonizadores e missionários que exploravam o interior de Angola. No entanto, rapidamente se tornou um local de refúgio espiritual também para os habitantes locais.

O Início da Lenda

Mas foi em 1641 que ocorreu um dos episódios mais conhecidos da história da Mamã Muxima. Durante a ocupação holandesa, a Igreja foi incendiada e a imagem da santa foi levada pelos invasores. A perda da imagem trouxe tristeza à vila e ao povo que já começava a venerá-la como símbolo de protecção e refúgio espiritual.

Seis anos depois, em 1648, Salvador Correia de Sá reconquistou Luanda e, para surpresa de muitos, a imagem de Nossa Senhora da Muxima foi encontrada entre os espólios dos holandeses.

Enquanto a imagem era restaurada em Luanda, dois moradores da vila reconheceram-na e decidiram levá-la de volta à sua igreja. Este regresso foi celebrado com enorme alegria e marcou o início de uma devoção ainda mais fervorosa.

O Significado da Lenda

Para os devotos, o retorno da imagem simbolizou mais do que um triunfo histórico. Representa a ligação divina entre Nossa Senhora e o povo angolano. Muitos acreditam que a santa escolheu permanecer com eles, reafirmando o seu papel de protectora e intercessora.

A imagem da Nossa Senhora da Muxima que repousa agora no altar principal, é considerada milagrosa por muitos fiéis. Lendas de curas inexplicáveis e protecção divina fortaleceram a devoção popular, transformando a igreja num importante centro de peregrinação ao longo dos séculos.

Essa fé inabalável reflecte-se nos testemunhos que ainda hoje fazem parte da tradição oral, com histórias de curas milagrosas, prosperidade e protecção alcançadas pela intervenção da Mamã Muxima.

A devoção à Mamã Muxima transcende o acto religioso em si. Os angolanos tratam a santa como uma figura próxima, quase familiar. Como bem descreveu o cónego Gericota que foi pároco da igreja.

“Os devotos não rezam apenas, conversam com a imagem, desabafam, pedem bênçãos e até a repreendem, como fariam com uma mãe muito querida”.

Este vínculo especial faz da Mamã Muxima uma padroeira viva na vida dos angolanos.

Tradições Associadas à Mamã Muxima

Ao longo dos anos, várias tradições se consolidaram em torno da devoção à Mamã Muxima. Os peregrinos que visitam o santuário levam consigo oferendas como velas, espigas de milho, galinhas, azeite e até objectos de prata e ouro. Estes presentes simbolizam a gratidão dos devotos e a confiança de que os seus pedidos serão atendidos.

Os pedidos variam: desde fertilidade para casais, protecção para as famílias, sucesso nos negócios, até a cura de doenças graves. A igreja tornou-se um local onde diferentes necessidades espirituais encontram uma expressão, unindo o povo numa devoção que mistura elementos da cultura tradicional angolana com a fé católica.

Um Lugar de Fé e Encontro

Hoje, milhares de pessoas continuam a visitar o santuário anualmente, especialmente durante as festividades de Agosto, quando a igreja e os arredores se enchem de cor, música e oração. O local é mais do que um espaço de culto; é um ponto de encontro onde as comunidades reforçam os seus laços e partilham histórias de fé e superação.

A lenda da Mamã Muxima não é apenas um relato do passado. É uma história viva que continua a inspirar milhares de fiéis, mostrando como a fé e a cultura se entrelaçam para criar uma devoção única em Angola. Para muitos, a Mamã Muxima não é apenas uma santa; é uma mãe espiritual, sempre presente e pronta para ouvir as preocupações de cada coração angolano.

Mesmo durante os períodos mais difíceis da história de Angola, incluindo a guerra civil, a fé na Mamã Muxima permaneceu inabalável. Hoje, o santuário da Nossa Senhora da Muxima é muito mais do que uma construção histórica. É um espaço sagrado que transcende divisões culturais e sociais, unindo pessoas de diferentes origens sob um mesmo propósito: a procura por espiritualidade e comunhão.

---

A Peregrinação

A peregrinação à Muxima é um dos aspectos mais emblemáticos da festa. Dias antes do evento principal, milhares de pessoas começam a caminhar em direcção à vila, muitas vezes enfrentando longas jornadas e condições desafiadoras. Para os fiéis, este esforço é uma expressão de sacrifício e entrega, simbolizando a jornada espiritual em busca de redenção e paz interior.

Os peregrinos não caminham sozinhos. Ao longo do longo caminho, formam-se comunidades temporárias onde partilham alimentos, histórias e orações. Este espírito de união é um dos elementos mais marcantes da peregrinação, reforçando os laços entre os participantes.

Procissões e Missas

As procissões são um dos momentos mais emocionantes da festa. Realizadas à noite, as velas carregadas pelos peregrinos iluminam a vila, criando um cenário de beleza espiritual incomparável. A procissão principal que carrega a imagem da Nossa Senhora, é acompanhada por cânticos e orações que ecoam com a devoção dos presentes.

A missa campal, celebrada no dia principal da festa, é o ponto alto da celebração. Presidida por bispos e padres, este momento reúne milhares de fiéis num acto de louvor e adoração colectiva. Para muitos, participar desta missa é uma experiência transformadora, marcada pela partilha da fé e pela gratidão.

Cânticos e Rezas

A música desempenha um papel essencial na celebração. Os cânticos entoados, muitas vezes em línguas locais como o kimbundu, são um elo entre a espiritualidade e a cultura angolana. Estes hinos, carregados de emoção e significado, ecoam as tradições ancestrais, transportando os fiéis para um estado de introspecção e ligação divina.

A vila da Muxima, situada à beira do majestoso rio Kwanza, é um destino sagrado que combina beleza natural e significado espiritual. Durante a festa, a vila transforma-se num santuário a céu aberto, acolhendo milhares de peregrinos que chegam na procura de paz e renovação.

Além do santuário, o cenário natural da Muxima contribui para a experiência única da peregrinação. O rio Kwanza, com as suas águas tranquilas, é frequentemente visto como um símbolo de purificação e renovação. Muitos peregrinos aproveitam a oportunidade para se religarem com a natureza, encontrando no ambiente uma extensão da espiritualidade que experimentam no santuário.

As estruturas históricas da vila, incluindo a igreja original, são testemunhos vivos de séculos de fé e tradição. Para os visitantes, caminhar pelas ruas da Muxima é como viajar no tempo, mergulhando numa história rica que continua a moldar a identidade religiosa e cultural de Angola.

A Festa da Nossa Senhora da Muxima é muito mais do que um evento religioso; é também uma celebração da cultura e das tradições angolanas. Durante os dias da festa, a vila torna-se um ponto de encontro onde diferentes culturas e costumes se cruzam, criando uma atmosfera vibrante e acolhedora.

Os mercados informais que surgem ao redor do santuário são um reflexo da diversidade cultural. Artesanatos, comidas típicas e objectos religiosos são vendidos, oferecendo aos visitantes uma oportunidade de levar consigo um pedaço da experiência da Muxima.

Estes mercados são também espaços de interacção social, onde histórias e conhecimentos são partilhados, enriquecendo ainda mais o significado da festa.

Além disso, a festa tem um impacto social significativo. É um momento para reforçar laços familiares e comunitários, promovendo valores como a solidariedade e a partilha. A hospitalidade dos habitantes da Muxima é um exemplo disso, acolhendo peregrinos com generosidade e calor humano.

Para os milhares de fiéis que participam da festa, a Nossa Senhora da Muxima é um símbolo de protecção, cura e esperança. Testemunhos de graças alcançadas, desde curas milagrosas até reconciliações familiares, reforçam a fé dos devotos e atraem novos peregrinos todos os anos.

Um dos aspectos mais inspiradores da devoção à Muxima é o poder de transformação espiritual que ela representa. Para muitos, a festa é uma oportunidade de recomeçar, renovando promessas, fortalecendo a sua relação com Deus. Este impacto vai além dos dias de celebração, influenciando positivamente a vida dos fiéis no seu dia-a-dia.

A Festa da Nossa Senhora da Muxima é uma expressão vibrante de fé, cultura e unidade em Angola. Mais do que uma celebração religiosa, é um testemunho do espírito sagrado e da devoção inabalável do povo angolano. Ao longo dos séculos, esta festa transformou-se num símbolo de esperança e renovação, tocando as vidas de milhares de pessoas.

Participar nesta festa é um acto de fé e uma oportunidade de mergulhar na rica tapeçaria cultural de Angola. A cada ano, a vila da Muxima reafirma-se como um espaço sagrado, onde a espiritualidade e a tradição convergem, inspirando aqueles que procuram força, paz e um propósito.